Carlos Fial @ 00:00

Qui, 25/11/10

1998. No tempo em que os deficits de seis por cento não abriam Telejornais. No tempo em que dívida pública era tema de conversa de quem apresentasse sérios sinais de esquizofrenia. No tempo em que as greves, eram bem mais perto do fim-de-semana, logo, bem melhores mecanismos de luta pelo bem-estar... de quem as praticava note-se. No tempo de fracas imposições e fortes Exposições. Durante esse já longínquo mas saudoso certame, que mais não seja pelo booom cultural que gravitou à sua volta, estas duas entidades tiveram a ideia de “expor”, num único concerto, as suas afinidades. O concerto virou álbum. O álbum por sua vez, decidiu virar obra-prima. Sim. Estou deveras consciente da subjectividade de tal classificação. Mas é. Acreditem. E, como diria um bem famoso contestatário, na altura ainda desconhecedor destes grevistas modelos reivindicativos, próprios do decadente Estado de Direito Social, “bem aventurados sejam”, se essa vossa crença for espontânea. Mas já ele, à sua evangélica maneira, ia anunciando o fim de tudo. O álbum contém três músicas dos Clã, mais nove de Sérgio Godinho. Pelo meio ainda houve tempo, e principalmente belo discernimento, para um fabuloso cover de Piazzola. É como um livro que, do alto da prateleira da livraria e do fundo da sua bolorenta espera, encontra finalmente o leitor para quem foi escrito. É como o sapato que finalmente encontrou a sua, um pouco menos bolorenta esperemos, Cinderela. Mas neste caso ficamos sem saber quem é o pé e quem é o sapato. Servem como uma luva, um ao outro estes fulanos. Claro está que, para tamanhos contadores (ou cantadores) de histórias, urge a criação de post a condizer em sábias e pertinentes palavras. Mas imbuiu-me de conveniente humildade para tais devaneios. Além do mais, o senhor do balcão do café brada a sua fúria contra “estes chulos” de grevistas que, ao contrário dele, contam com os cifrões certinhos ao fim do mês e, ao contrário de mim, não escalonaram a folga semanal para dia de greve geral… Godinho é mestre na musicalidade da palavra. Hélder Gonçalves esmerou-se nos arranjos. A Manuela… bem… é a Manuela. O senhor do balcão continua a expor a sua raiva e a impor sobremaneira o seu agouro do Fim de Tudo. Eu, por minha vez, continuo apologista que as maiores teorias de antevisão do Fim de Tudo sempre se fizeram á sombra da máquina de café… ou de finos, dependendo do fim de que “tudo” se trate. Cada fim trás por sua vez um inicio… de um outro fim qualquer.

 




Pedro Pereira @ 15:45

Qui, 25/11/10

 

Para o bem e para o mal, vale que, na vida, nada é definitivo. Fins e inícios andam aí aos molhos. E estamos fartos de perceber que a única coisa que não sabemos é a duração.
Excelente post! Esqueceste-te de uma coisa: "O Abraço."



Nota: São álbuns como este que ajudam a prolongar sensações de bem-estar.
Duas vozes inconfundíveis e autênticos génios da música - isso é indiscutível. Mas é engraçado constatar que, mesmo apesar de algumas letras mais tristes, a pujança, vivacidade e outra-coisa-qualquer-que-não-consigo-nomear que imprimem confere a todas as músicas uma conotação alegre, de positivismo (não querendo desvalorizar os outros músicos que fizeram o álbum).
Não concordas?


Carlos Fial @ 18:53

Qui, 25/11/10

 

Concordo absolutamente! Mas isso sempre foi uma das características que mais admirei em Godinho. A nível melódico sempre preferiu tonalidades maiores, mais vivas e abertas. quando a previsibilidade de quem houve espera um menor melancólico... Acho que nessa imprevisibilidade melódica Clã e Sérgio Godinho são de facto gémeos. Mas na palavra Godinho é qualquer coisa de magnífico. E depois os arranjos fugiram aos originais de forma muito sui generis... A minha preferida é a faixa dois, "Lá em Baixo". Queria postar essa mas não tive tempo de a pôr no tube... Não sei se conheces o original, ouves uma e depois a outra e é um chapadão brutal que levas na cara! Mesmo com a problema de expressão dos clã foi uma volta brutal que deram aquilo. Mas por exemplo... O Homem Fantasma. É do álbum Pano Cru. Para aí de setenta e tais creio. Deram-lhe uma electricidade do caraças!!!!! E era uma musica perdida no meio do album... Entre musicas como "O Primeiro Dia" ou " A vida é feita de pequenos nadas". Confesso que de clã nem sou grande seguidor. Há musicas deles que adoro mas outras passam-me ao lado. Se calhar por nunca me ter debruçado muito sobre eles... eh pah. Mas este album, para mim o único defeito, é que escolheram mal o single... Não sei porquê... A "Espectáculo é boa musica mas... é muita diversidade dentro de um só disco. E depois vem a carga poética... Comprei o CD na altura depois de o ter ouvido num café. Perdi a coisa e esta semana deparei-me com o objecto. É daqueles que não me leva a escolher as faixas sabes... É do principio ao fim.
Pois foi... Esqueci-me do abraço. Grande gaffe. Já imaginaste se o José Rodrigues dos Santos se esquecesse do "nós voltamos a ver-nos amanhã"?


Pedro Pereira @ 19:02

Qui, 25/11/10

 

Eu, pelo contrário, acompanho mais os Clã do que Sérgio Godinho.
Quanto à preferida deste álbum, partilho a opinião!

Hugo Sousa @ 21:26

Qui, 25/11/10

 

Brilhante post, brilhante música! :)


Carlos Fial @ 19:07

Sex, 26/11/10

 

Não menos brilhantes os teus gostos Hugo!!!

“A música exprime a mais alta filosofia numa linguagem que a razão não compreende” Arthur Schopenhauer
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